PLACEBOS: O EFEITO DA CRENÇA
Mesmo superficialmente, todo aluno de medicina aprende que a
mente tem influência direta sobre o corpo e sabe que as pessoas se sentem
melhor quando pensam (ainda que não seja verdade) que estão tomando
medicamentos. A cura ou a melhora pela ingestão de pílulas de açúcar é
classificada como “efeito placebo”. Meu amigo Rob Williams, fundador da
Psich-K, um sistema psicológico de tratamento com base em energia, sugere que o
melhor termo a ser usado nesses casos é “efeito percepção”. Eu prefiro chamar
de “efeito-crença” para enfatizar que nossas percepções, sejam elas precisas ou
não, têm grande impacto sobre nosso comportamento e nosso corpo.
Considero o efeito-crença uma prova da habilidade de cura da
mente/corpo. No entanto, por se tratar de algo que “ocorre apenas na mente”, o
efeito placebo tem sido associado pela medicina a algo que só funciona com
charlatães ou, na melhor das hipóteses, com, pacientes fracos e sugestionáveis.
Mas o assunto é abordado muito rápida e superficialmente nas escolas de medicina.
Os professores passam logo às matérias que tratam das verdadeiras ferramentas
modernas: as drogas e a cirurgia.
Infelizmente, isso é um grande erro. O efeito placebo
deveria ser um dos principais tópicos de estudo para estudantes de medicina. Os
médicos deveriam ser treinados para reconhecer o poder de nossos recursos
internos, e não para considerar o poder da mente como algo simples e inferior
ao poder dos elementos químicos ou de um bisturi. Está na hora de deixarem de
lado sua convicção de que o corpo e seus membros são desprovidos de
inteligência e que precisamos de elementos externos para manter a saúde.
O efeito placebo deveria ser alvo de pesquisas patrocinadas.
Se os pesquisadores descobrissem como utilizá-lo, poderíamos ter uma ferramenta
mais eficiente, à base de energia e sem efeitos colaterais, para tratar as
doenças. Os profissionais que utilizam a energia como instrumento de cura
afirmam já ter essas ferramentas; porém, como cientista, acredito que, quanto
mais descobrirmos sobre a ciência do placebo, mais facilmente poderemos
utilizá-la sob condições clínicas.
Creio que este desprezo da medicina em relação à mente seja
resultado não apenas do pensamento dogmático, mas também de aspectos financeiros.
Se o poder da mente pode curar doenças, para que ir ao médico? E o mais
importante: por que tomar remédio? Para meu desgosto, descobri recentemente que
a indústria farmacêutica vêm estudando os pacientes que reagem ao tratamento
com pílulas de açúcar com o objetivo de eliminá-los das experiências médicas. É
desconcertante para essas empresas saber que na maioria dos experimentos seus
medicamentos “falsos” têm o mesmo efeito que os grandes coquetéis químicos
(Greenberg,2003). Embora essas empresas insistam em afirmar que não estão
tentando, com isso, fazer com que medicamentos ineficazes sejam aprovados pelo
governo, fica claro que a eficácia das pílulas placebo são uma ameaça para
elas. A mensagem é muito clara para mim: já que não conseguimos competir com o
placebo de maneira honesta, vamos eliminar a competição!
É engraçado pensar que os médicos não são treinados para
lidar com o efeito placebo, pois alguns historiadores afirmam categoricamente
que a história da medicina é a história do placebo. No início, os médicos não
dispunham de métodos eficazes para curar as doenças. Os métodos mais conhecidos
no passado eram a sangria, o tratamento de ferimentos com arsênico e o
famigerado veneno de cobra, utilizado para todos os fins. É claro que pelo
menos um terço dos pacientes, aqueles considerados suscetíveis ao efeito
placebo, apresentavam melhoras com esses tratamentos. E, mesmo no mundo de
hoje, quando os médicos em seus aventais brancosreceitam medicamentos, os
pacientes acreditam que vão melhorar e acabam melhorando, seja por meio de
pílulas de verdade ou apenas de açúcar.
Embora a questão de como o placebo age ainda seja ignorada
pela medicina, alguns pesquisadores já começam a prestar mais atenção ao
assunto. Os resultados de seus estudos sugerem que não apenas os tratamentos
utilizados no século 19 como a sofisticada tecnologia da medicina atual, com
todas as suas ferramentas “concretas”, pode estimular o efeito placebo.
Um estudo da Escola de Medicina Baylor publicado em 2002 no
New England Journal of Medicine avaliou o resultado de cirurgias em pacientes
com problemas sérios de dores nos jeolhos (Moseley, et al., 2002). O principal
autor do estudo, Dr. Bruce Moseley, “sabia” que a cirurgia ajudava seus
pacientes: “Todo bom cirurgião sabe que não há efeito placebo em cirurgias”.
Mas ele queria descobrir qual parte da cirurgia trazia alívio aos pacientes.
Dividiu-os em três grupos e raspou a região da cartilagem danificada de um
grupo. No outro grupo, afastou a junta do joelho e eliminou, com a ajuda de um
jato d’água, a parte que imaginava estar causando a inflamação. Os dois métodos
são considerados tratamentos-padrão para problemas de artrite nos joelhos. Já
no terceiro grupo, Moseley “simulou” uma cirurgia. Sedou o paciente e fez três
incisões em seu joelho. Durante todo o tempo agiu como se estivesse realmente
executando a cirurgia. Jogou até água sobre o local para simular o
procedimento. Após 40 minutos costurou as incisões. Prescreveu aos pacientes
dos três grupos o mesmo tratamento pós-cirurgia, que incluía um programa de exercícios.
O resultado foi impressionante. Sim, os grupos que receberam
a cirurgia de verdade obtiveram melhoras. Mas o grupo placebo também! A
conclusão é que, apesar de serem realizadas mais de 650 mil cirurgias em
joelhos com artrite por ano, cada uma delas por cerca de 5 mil dólares, uma
coisa ficou muito clara para Moseley, que declarou: “Minhas habilidades de
cirurgião não resultaram benefício algum para esses pacientes. O único efeito
em todas elas foi o placebo”. Os programas de TV anunciaram os resultados da
pesquisa e mostraram imagens do grupo placebo andando, jogando basquete e
desempenhando tarefas que não conseguiam antes da “cirurgia”. Só ficaram
sabendo que não tinham sido operados de verdade dois anos depois. Um deles,
chamado Tim Peres, disse que antes andava com a ajuda de uma bengala, mas que
hoje consegue jogar basquete com os netos. Em uma declaração para o Discovery
Health Channel, resumiu o tema de seu livro: “Qualquer coisa é possível neste
mundo desde que sua mente queira. A mente é capaz de verdadeiros milagres”.
Estudos mostram que o efeito placebo também é eficaz no
tratamento de diversas outras doenças como a asma e o mal de Parkinson. Em
casos de depressão, já se tornou um dos principais métodos utilizados, algo tão
comum que o Dr. Walter Brown, da Brown University School of Medicine, sugere
pílulas com açúcar como primeiro tratamento em casos de depressão moderada
(Brown,1998). Os pacientes são informados de que estão tomando remédios sem
ingredientes ativos, mas isso não atrapalha o tratamento. Pesquisas mostram que
mesmo quando eles sabem que estão tomando placebo, o efeito acaba sendo
positivo.
Uma indicação do poder do placebo é apresentada em um
relatório do Departamento norte-americano de saúde e assistência social. Segundo
o documento, metade dos pacientes com depressão profunda que toma medicamentos
com ingredientes ativos melhora e 32% daqueles que tomam placebo obtêm os
mesmos resultados (Horgan, 1999). Mesmo esse estudo, porém, subestima o poder
do placebo, pois muitos participantes da pesquisa percebem que estão tomando um
medicamento verdadeiro porque sentem os efeitos colaterais que os os outros,
que tomam apenas placebo, não sentem. Então, uma vez acreditando que estão
tomando pílulas de verdade, tornam-se ainda mais suscetíveis ao afeito placebo.
Bem, com tantos efeitos positivos do placebo, não é de se
surpreender que a indústria de antidepressivos de 8,2 bilhões de dólares esteja
sendo acusada de exagerar na propaganda sobre a eficácia de suas pílulas. Em um
artigo publicado em 2002 no periódico Prevention & Treatment, da American
Psychological Association (Associação Psicológica Americana), “The emperor’s
new drugs” (As novas drogas do imperador), o professor de psicologia Irving
Kirsch, da Universidade de Connecticut, afirma ter descoberto que 80% do efeito
dos antidepressivos, segundo experiências clínicas, pode ser atribuído ao
efeito placebo (Kirsch et al,.2002). Kirsch usou a lei de liberdade de
informações em 2001 para obter informações sobre as experiências clínicas
feitas com os antidepressivos mais utilizados no mercado. Não se trata de dados
extraídos do instituto Food and Drug Administration (FDA). Os números mostram
que em mais da metade dos casos os antidepressivos não foram mais eficazes que
o placebo. Kirsch declarou em uma entrevista para o Discovery Health Channel: “A
diferença entre o efeito das drogas e o do placebo foi menos de dois pontos na
média da escla clínica, que vai de 50 a 60 pontos. É uma diferença muito
pequena, quase insignificante sob o ponto de vista clínico”.
Outro fato interessante sobre o efeito dos antidepressivos é
que eles vêm obtendo desempenho cada vez melhor em testes clínicos nos últimos
anos, o que sugere que seus efeitos placebo se devem, em grande parte, a
estratégias de marketing. Quanto mais os efeitos milagrosos dos antidepressivos
são divulgados pela mídia e pela propaganda, mais eficazes eles se tornam. As
crenças são contagiosas! Vivemos hoje em uma cultura em que as pessoas
acreditam que os antidepressivos funcionam. Por isso eles funcionam.
Uma designer do interior da Califórnia chamada Janis
Schonfeld, que participou de um teste clínico sobre a eficácia do medicamento
Effexor (venlafaxine) em 1997, ficou tão surpresa quanto Perez ao descobrir que
vinha tomando placebo. Os comprimidos não apenas aliviaram a depressão que a
incomodava havia 30 anos, como os exames que fez mostraram que a atividade de
seu córtex pré-frontal havia aumentado (Leuchter ET AL.,2002). Mas a melhora
não foi apenas no cérebro. Quando nossa mente se modifica, o corpo acompanha as
mudanças. Schonfeld também sentiu náusea, um efeito colateral bastante comum do
Effexor. Como a maioria dos pacientes que melhora após um tratamento com
placebo e depois descobre que estava tomando pílulas de açúcar, ela achou que o
médico tivesse se enganado. Tinha certeza de que estava tomando o remédio
verdadeiro e pediu que fossem refeitos todos os exames para se certificar.
Bruce H. Lipton (A Biologia da Crença, cap 5, págs. 163 a
168)