quarta-feira, 16 de julho de 2014

A Volta Para Casa (o retorno ao próprio Self)


A volta ao lar refere-se à conexão com a própria alma.
Todos nós temos a tendência de nos deixar levar pelas exigências do diário viver, que envolvem casa, família, trabalho e todas as responsabilidades que acumulamos.
Quando perdemos contato com quem somos internamente, a vida torna-se pouco criativa. Nós não podemos nos esquecer de que é a alma quem fertiliza o campo das ações.  Quando recuperamos esse alinhamento, a vida volta a ser criativa, nossos campos verdejam e as flores desabrocham.
Abaixo, separei um trecho do livro, “Mulheres que Correm com os Lobos”. Este livro trata da alma feminina, de forma profunda e embasada em contos de fadas e mitos de diversos povos através do mundo. Embora seja voltado à mulher, acredito que seja muito útil aos homens também, em função de seu aprendizado pessoal, bem como para entender melhor a natureza feminina e cuidar melhor daquelas que os cercam.
O trecho abaixo está inserido na história da mulher foca, que trata da volta ao lar ou o retorno ao próprio Self.

(Mulheres que Correm com os Lobos, p.353-355)

A volta ao lar pode ser muitas coisas diferentes para mulheres diferentes. (...) É importante compreender que a volta ao lar não implica necessariamente gastar dinheiro. Gasta-se tempo. Essa volta exige uma firme determinação de dizer “Eu vou” e de estar falando a sério. Você pode simplesmente avisar, já de costas, “estou indo, mas vou voltar”, mas você precisa continuar na direção certa mesmo assim.
Há muitas formas de volta ao lar. Muitas são rotineiras; algumas são sublimes. Minhas clientes me dizem que as seguintes iniciativas práticas representam uma volta ao lar para elas... Embora eu deva admitir que a exata localização da saída para essa volta muda de vez em quando, de modo que num mês ela pode ser diferente do mês anterior. Reler trechos de livros e de poemas isolados que as comoveram. Passar até mesmo alguns minutos sem as crianças por perto. Sentar na varanda debulhando, tricotando ou descascando. Caminhar ou passear de carro por uma hora, em qualquer direção, e depois voltar. Apanhar qualquer ônibus, com destino desconhecido. Tocar um instrumento enquanto se ouve música. Assistir ao nascer do sol. Ir de carro até um lugar em que as luzes da cidade não prejudiquem a visão do céu noturno. Orar. Estar com uma amiga especial. Ficar sentada numa ponte com as pernas balançando no ar. Segurar um bebê no colo. Sentar-se junto a uma janela num café e escrever. Sentar-se num círculo de árvores. Secar o cabelo ao sol. Pôr as mãos num barril cheio de água da chuva. Envasar plantas, fazendo questão de enlamear muito as mãos. Contemplar a beleza, a graça, a comovente fragilidade dos seres humanos.
Portanto, a volta ao lar não implica necessariamente uma árdua viagem por terra. Entretanto, não quero dar a entender que seja algo simples, pois existe muita resistência à volta ao lar, seja ela fácil ou não.
Existe uma outra explicação para a atitude das mulheres de adiar a volta, uma explicação que é mais misteriosa, ou seja, o excesso de identificação da mulher com o arquétipo do curador. Ora, um arquétipo é uma força enorme que nos é tanto misteriosa quanto instrutiva. Ganhamos muito se ficamos perto desse arquétipo, se o imitamos, se mantemos um relacionamento equilibrado com ele. Cada arquétipo possui suas próprias características que ratificam o nome que lhe damos: o da grande mãe, o da criança divina, o do deus-sol e assim por diante.
O arquétipo do grande curador contém sabedoria, bondade, conhecimento, solicitude e todas as outras qualidades associadas a quem cura. Portanto, é bom ser generosa, delicada e solícita como o arquétipo do grande curador. Mas, só até certo ponto. Além desse ponto, esse arquétipo exerce uma influência prejudicial na nossa vida. A compulsão das mulheres no sentido de “tudo curar, tudo consertar” é uma importante armadilha formada pelas exigências a nós impostas pelas nossas próprias culturas, especialmente as pressões no sentido de que provemos que não estamos por aí sem fazer nada, ocupando espaço e nos divertindo, mas sim, que temos um valor resgatável. Em algumas partes do mundo, pode-se dizer que o exigido é uma prova de que temos valor e, portanto, deveria ser permitido que vivêssemos. Essas pressões são inseridas na nossa psique quando somos muito jovens e incapazes de ter uma opinião sobre elas ou de lhes oferecer resistência. Elas se tornam uma lei para nós... a não ser que, ou até que, as desafiemos.
No entanto, os clamores do mundo em sofrimento não pode ser todos atendidos por uma única pessoa o tempo todo. Na realidade, só podemos optar por atender àqueles que nos permite voltar ao lar com regularidade; em caso contrário, as luzes do nosso coração praticamente se apagam. O que o coração deseja ajudar é às vezes diferente dos recursos da alma. Se a mulher valoriza sua pele da alma, ele irá decidir essas questões de acordo com sua proximidade do “lar” e com a frequência de sua presença ali.
Embora os arquétipos possam se manifestar através de nós de quando em quando, naquilo que chamamos de experiência numinosa, nenhuma mulher tem condições de permitir a manifestação contínua de um arquétipo. Somente o próprio arquétipo consegue suportar projeções tais como a de disponibilidade permanente, de total generosidade, de energia eterna. Nós podemos tentar imitar essas qualidades, mas elas são ideais, fora do alcance do ser humano, e é assim que deve ser. No entanto, a armadilha exige que as mulheres se esgotem tentando atingir esses níveis fantásticos. Para evitar a armadilha, temos de aprender a dizer “Alto lá”, e “Parem a música”, e é claro que temos de estar falando a sério.
A mulher tem de se afastar, ficar sozinha e examinar, para início de conversa, como ficou presa a um arquétipo. É preciso resgatar e desenvolver o instinto selvagem básico que determina os limites “só até aqui e nem um passo a mais, só esse tanto e nada mais”. É assim que a mulher se mantém norteada. É preferível voltar ao lar por algum tempo, mesmo que isso irrite os outros, em vez de ficar, para se deteriorar e acabar indo embora rastejando, em frangalhos.

Portanto, mulheres que estão cansadas, que estão temporariamente cheias do mundo, que têm medo de tirar uma folga, têm medo de parar, acordem imediatamente! Cubram com um cobertor o gongo estridente que no para de pedir que vocês ajudem aqui, ajudem ali, ajudem mais acolá. Ele ainda estará ali para que você lhe retire o cobertor, se assim desejar, quando estiver de volta. Se não voltamos para casa quando chega a hora, deixamos de ver com nitidez. Encontrar nossa pele, vesti-la, ajeitá-la bem, voltar para casa, tudo isso nos ajuda a ser mais eficazes quando estivermos de volta. Existe um ditado que diz: “É impossível voltar às origens”. Não é verdade. Embora não se possa realmente voltar para dentro do útero, pode-se retornar ao lar da alma. E não é apenas possível; é indispensável.

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