quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Sincronicidade: Coincidências Significativas

SINCRONICIDADE

 No decorrer de nossa vida nos deparamos com as mais diversas circunstâncias. Muitas  delas, a maioria, passa mecanicamente, sem que percebamos em seu âmago algo especial ou determinante de novas situações.

 Mas, há certos momentos nos quais nosso estado de consciência se altera, em que conseguimos nos dar conta de algo que se move no “interior” dessas situações.

 Perceber a ligação entre nossa psique e os eventos externos é importante para detectarmos a expressão do Inconsciente Coletivo.

Um dos fenômenos mais ricos nesse sentido é a SINCRONICIDADE.

 Este termo foi criado por Carl Gustav Jung, médico psiquiatra, um dos mais célebres contribuintes para a moderna psicologia. Sobre esta questão ele disse: “Minha preocupação, com relação à psicologia dos processos inconscientes, obrigou-me, há muito tempo,  a procurar – além da causalidade – outro princípio de explicação, uma vez que o princípio da causalidade me parecia impróprio para explicar certos fenômenos surpreendentes da psicologia do inconsciente. Encontrei, assim, fenômenos psicológicos paralelos, que não podiam ser ligados entre si casualmente; deviam ser ligados de outra forma, por outro desenrolar de acontecimentos. Esta conexão de acontecimentos parecia-me ser essencialmente dada, por sua relativa simultaneidade, de onde o termo ‘sincronístico’. Parece, com efeito, que o tempo, longe de ser uma abstração, é um continuum concreto; ele inclui certas qualidades ou condições fundamentais que se manifestam, simultaneamente, em lugares diferentes, com um paralelismo que não pode ser explicado pela casualidade. É o caso, por exemplo, de símbolos, idéias ou estados psíquicos de aparecem simultaneamente”.

 Antes de adentrarmos no tema, vamos a uma breve explanação de alguns temas que vão ajudar na compreensão deste assunto:
 
a)      Consciência: é um “dar-se conta”, “aperceber-se” de uma realidade. Jung diz que nossa consciência não se cria a si mesma, mas emana das profundezas desconhecidas. Desperta gradualmente na infância e, ao longo da vida sai das profundezas do sono, de um estado de inconsciência.
 
b)      Inconsciente: é constituído por tudo aquilo que ignoramos, por aquilo que não tem qualquer relação com o eu, centro dos campos de consciência. É o desconhecido do mundo interior. Engloba tudo que conhecemos, mas sobre o que não pensamos num dado momento, tudo aquilo de que já tivemos consciência mas esquecemos, tudo o que foi percebido pelos sentidos e que o espírito consciente não registrou, tudo o que involuntariamente e sem prestar atenção (isto é, inconscientemente), sinto, penso, relembro, desejo e faço, todo o futuro que se prepara em nós e que só mais tarde se tornará consciente. Tudo isso é conteúdo do inconsciente. É de dois tipos: pessoal e coletivo.

c)      Inconsciente Pessoal: conjunto de todos os conteúdos reprimidos, assim como os instintos e os impulsos que levam à execução de ações comandadas por uma necessidade, mas não por uma motivação consciente (complexos). Esses conteúdos são parte integrante da personalidade individual e poderiam, pois, se tornar conscientes.

d)     Inconsciente Coletivo: zona ou faixa psíquica onde estariam as figuras, símbolos e conteúdos arquetípicos de caráter universal, frequentemente expressos em termos  mitológicos.

e)      Arquétipo: forma imaterial à qual os fenômenos psíquicos tendem a se moldar. É o modelo inato que serve de matriz para o desenvolvimento da psique. Os arquétipos são as tendências estruturais invisíveis dos símbolos. Criam imagens ou visões que correspondem a alguns aspectos da situação consciente. Também são chamados de imagens primordiais e, segundo Jung, se originam de uma constante repetição de uma mesma experiência, durante muitas gerações.

 
SINCRONICIDADE: CONCEITO

 Sincronicidade é uma COINCIDÊNCIA SIGNIFICATIVA que faz a ligação entre nossa psique e uma ocorrência exterior, na qual sentimos uma sensação de união entre o ser interior e o ser exterior. 

Diz Jung: “Escolhi o termo ‘sincronicidade’ porque a aparição simultânea dos dois acontecimentos, ligados pela significação, mas sem relação causal, me pareceu um critério decisivo. Emprego, pois, aqui, o conceito geral de sincronicidade, no sentido especial de coincidência, no tempo, de dois ou vários elementos, sem relação causal e que têm o mesmo conteúdo significativo, ou um sentido similar. Isto não é o mesmo que sincronismo, cujo significado é apenas o da aparição simultânea de dois fenômenos”.

A sincronicidade traz em si o conceito da totalidade, característica do Inconsciente Coletivo. O sentido de totalidade nos faz perceber que ninguém está isolado, que todos os fenômenos estão interligados e se influenciam mutuamente. O Inconsciente não é algo estático, mas possui um dinamismo próprio que objetiva a integração do ego. Ele usa dos elementos visíveis para que possamos nos conscientizar dos “invisíveis”, isto é, daquilo que não é óbvio para o ego, que se encontra num nível inconsciente.

 

CARACTERÍSTICAS DA SINCRONICIDADE

 A sincronicidade se dá nos mundos interno (psique) e externo, simultaneamente. Jung afirma que todas as pessoas, assim como os objetos, animados e inanimados, estão interligados por meio do Inconsciente Coletivo.

Como explicar o caso de uma pessoa que sonha ou tem um pensamento, ou um estado psicológico interior que coincida com um acontecimento exterior? Quem nunca vivenciou um fenômeno desses, em que uma coincidência significativa se deu, aparentemente sem explicação?

São exemplos de sincronicidade: sonhar com um acontecimento e ver ele se cristalizar no mundo físico, palpável; querer encontrar alguém e de repente topar com essa pessoa “por coincidência”; pensar em algo e ver que havia outra pessoa com a mesma idéia...

O fenômeno da sincronicidade atesta a idéia oriental da unidade de todas as coisas, isto é, estamos todos mergulhados na chamada “Alma Universal”, daí podemos perceber o que os outros percebem. Faculdades como a telepatia, protagonista de muitas sincronicidades, não seriam possíveis sem a evidência dessa totalidade que permeia a vida.

O indivíduo está no todo e o todo no indivíduo. Hermes Trismegisto, grande sábio da antiguidade, deixou um axioma que é muito conhecido: “assim como é acima é abaixo, assim como é abaixo é acima”.

Normalmente, a maior parte das pessoas têm dificuldade em perceber e aceitar a sincronicidade, bem como outros fenômenos, porque estão presas ao racionalismo. A percepção da totalidade ou unidade de todas as coisas é própria do lado criativo, emocional e mesmo intuicional do ser humano.

R. H. Blyth, erudito em haiku, disse: “O intelecto pode entender qualquer parte de algo como uma parte, porém não como um todo; pode compreender qualquer coisa que não seja Deus”.

Não devemos confundir sincronicidade com sincronia. Um evento sincrônico é qualquer coisa simultânea, eventos que ocorrem ao mesmo tempo (relógios, horários de ônibus, de aulas em escola, etc.). Na sincronicidade a “coincidência” tem um sabor especial, acontecendo de um marco de tempo subjetivo. A pessoa consegue fazer a ligação de dois episódios, e não é preciso que sejam simultâneos, embora com freqüência isso aconteça.

Sincronicidade e emocionalidade estão intimamente associadas. A sincronicidade provoca um estado emocional transformador. Ao percebermos um evento sincronístico somos tomados de uma emoção especial, que pode provocar mudanças imediatas em nossos estados de ânimo, ou mesmo propiciar alteração profunda de comportamentos.

 
TIPOS DE SINCRONICIDADE

Jung classificou a sincronicidade em três tipos:

1)      Coincidência entre o conteúdo mental (que pode ser um pensamento ou um sentimento) e um evento externo. Ex: pensar em alguém e topar com ele ou ela na rua.

2)      Ter um sonho ou visão que coincide com um acontecimento que está ocorrendo a certa distância (e isto é comprovado mais tarde). Ex: premonições e pressentimentos no momento do acontecimento.

3)      Uma pessoa vê uma imagem (como sonho, visão ou premonição) de algo que ocorrerá no futuro e que então efetivamente acontece. Ex: visão clarividente ou onírica de acontecimentos futuros.

Na sincronicidade é o participante que determina (através de sentimentos meramente subjetivos) se as coincidências são significativas. A sincronicidade é o princípio que Jung postula como o elo que liga a psique e o evento numa coincidência significativa.
 
A sincronicidade está embutida na causalidade. Para avaliar um evento sincronístico é preciso ter a capacidade de notar um estado interior subjetivo, e então conecta-lo intuitivamente a um evento exterior a ele interligado.

 
SINCRONICIDADE E INCONSCIENTE COLETIVO

Para Jung, a camada arquetípica do inconsciente está envolvida em eventos sincronísticos. É no Inconsciente Coletivo, universal e congênito que se encontram os arquétipos, padrões de comportamento instintivo, segundo Jung tão numerosos quantas as situações típicas que houver na vida. A repetição infinita gravou essas experiências dentro de nossa constituição psíquica. São exemplos de situações arquetípicas: nascimento, morte, casamento, laços entre mãe e filho, entre pai e filho, as lutas heróicas, etc.
 
Também entram no conceito de arquétipo as “imagens primordiais (aliás, outra maneira de conceituar um arquétipo) ou figuras que são ativadas e então revestidas com uma coloração emocional inferida pessoalmente.

O Self (si-mesmo) segundo Jung, é o ponto médio relacionado tanto com o Ego como com o Inconsciente, sem contudo ser equivalente a nenhum dos dois. O Self corresponde ao Tao oriental. É uma fonte de energia que impele a pessoa a “tornar-se o que ela é”, conferindo um sentido de ordem à personalidade. Vejamos o que Jung fala sobre o Self ou Si-Mesmo: “O si-mesmo é uma realidade ‘sobre-ordenada’ ao eu consciente. Abrange a psique consciente e a inconsciente, constituindo por esse fato uma personalidade mais ampla, que também somos... Mas não devemos nutrir a esperança de chegar a uma consciência aproximada do si-mesmo; por mais consideráveis e extensas que sejam as paisagens interiores e os setores apreendidos pela consciência, não desaparecerá à massa imprecisa e uma soma desconhecida de inconsciência, que também faz parte integrante da totalidade do si-mesmo. O si-mesmo é o centro e também a circunferência completa que compreende ao mesmo tempo o consciente e o inconsciente; é o centro dessa totalidade, como o eu é o centro da consciência”.

Jung afirma que não há nenhuma evolução linear; há apenas a circum-ambulação do self.

A sincronicidade é o princípio que faz a ligação entre nossa psique e uma ocorrência exterior, na qual sentimos uma misteriosa sensação de união entre o ser interior e o ser exterior. No decorrer da experiência de uma ocorrência sincronística, em vez de nos sentirmos como entidades separadas, isoladas num vasto mundo, experimentamos a interligação com os outros e percebemos o universo num nível profundo e significativo. Essa conexão subjacente é o Inconsciente Coletivo, e o evento sincronístico é uma de suas manifestações específicas.

 
PORQUE A SINCRONICIDADE ACONTECE

Como vimos, a sincronicidade é uma das formas de comunicação do Inconsciente Coletivo, uma das maneiras em que se expressa no mundo exterior. Ela ocorre dentro da “dança” ou circum-ambulação descrita por Jung. O Self quer que tomemos consciência da dança ou mutação do universo interior e que consigamos a integração com ele. É para isso que põe em ação os eventos sincronísticos.

O que proporciona a mudança causada pelos eventos sincronísticos são os estados psíquicos de alta sensitividade. Mudanças de estado emocional proporcionam a elevação do tônus do inconsciente, criando facilmente um declive em que o inconsciente pode fluir para o consciente. A consciência cai, então, sob a influência de impulsos e conteúdos instintivos inconscientes. Geralmente, estes últimos são complexos cuja base última é o arquétipo.

O inconsciente contém, igualmente, percepções subliminares, bem como imagens esquecidas na memória que não podem ser reproduzidas no momento, ou mesmo nunca. Mas, estas imagens radicadas ou não em bases já existentes, se acham em uma relação significativa, análoga ou equivalente a acontecimentos objetivos que não tem com eles nenhuma relação causal reconhecível ou mesmo imaginável.

Há, no inconsciente, uma espécie de conhecimento ou “presença a priori” de acontecimentos, sem qualquer base causal. Jung denominou essa “presença” de “espírito” que, autonomamente, move os arquétipos.

A alma se acha tão desejosa daquela coisa que ela gostaria de realizar, que escolhe espontaneamente a hora ou o momento melhor e mais significativo, que rege também as coisas que concordam melhor com o objetivo de que se ocupa. Aquilo que somos internamente mobiliza forças para alcançar sua meta.

Jung, em seu livro “Sincronicidade”, diz: “O fenômeno da sincronicidade é constituído, portanto, de dois fatores: 1) uma imagem inconsciente alcança a consciência de maneira direta (literalmente) ou indireta (simbolizada ou sugerida) sob a forma de sonhos, associação ou premonição; 2) uma situação objetiva coincide com este conteúdo. Tanto uma coisa como a outra podem, por assim dizer, causar admiração.

 
CONCLUSÃO

A sincronicidade é uma das formas em que o Inconsciente se comunica com o mundo exterior. É um fenômeno especial e que pode produzir insights no psiquismo humano, na medida em que o indivíduo permita-se dar vazão à sua emocionalidade.

Fechamos este trabalho sobre a sincronicidade com as palavras de Jung:

“A emocionalidade da alma humana constitui (realmente) a causa principal de todas as coisas, porque pode afeta-las e modifica-las. A alma se acha, com efeito, tão desejosa daquela coisa que ela gostaria de realizar que escolhe espontaneamente a hora astrológica melhor e mais significativa que rege também as coisas que concordam melhor com o objetivo de que se ocupa”.

 
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