segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Câncer: Uma Abordagem Psicossomática (5)


O CÂNCER COMO CARICATURA DE NOSSA REALIDADE

Relatos sobre pessoas com câncer que foram “inesperadamente ceifados da vida pela pérfida doença na flor da idade, no auge de suas carreiras e de suas responsabilidades” parecem contradizê-lo diametralmente. Quando se observam as histórias de vida que estão ocultas por trás disso, tal forma de falar reflete uma assombrosa cegueira para temas sombrios. Um olhar mais atento revela que o acontecimento não se deu de forma assim tão repentina e sem prévios sinais de alarme. Justamente a falta de qualquer reação corporal e qualquer sintoma é um sinal de “normopatia”.

A ênfase nas grandes responsabilidades, quando examinada com precisão, revela que o afetado cumpria com os seus deveres sem se queixar. Responsabilidade, ao contrário, significa a capacidade de dar uma resposta às necessidades da vida. Mas os pacientes potenciais de câncer não possuem essa capacidade. Como eles não podem impor limites e mal podem dizer não, eles facilmente se deixam sobrecarregar com obrigações. Por outro lado, eles se assumem de bom grado, para dar um sentido externo a suas vidas – na falta de um sentido interno. Os logros e êxitos obtidos são portanto bons disfarces – por trás dos quais pululam sentimentos de falta de sentido e depressões.

A psiquiatria conhece como depressão larval aquelas depressões por trás das quais se ocultam sintomas físicos. Por ocasião dos acontecimento cancerígeno, não é raro encontrar depressões ocultas atrás do êxito externo. Aqui, a larva é tida em tão alta consideração pela sociedade que não se pode nem mesmo pensar em um sintoma. Sob muitos pontos de vista, a típica personalidade cancerígena é considerada modelar. Ela é valente e não agressiva, quieta e paciente, atua de maneira equilibrada e tão simpática porque não é egoísta, além disso é desinteressada e solícita, pontual e metódica – não lhe falta praticamente nenhum dos ideais desta sociedade, e portanto não é de admirar que esteja intimamente ligada a esse sintoma. O êxito social, apesar ou justamente devido à rigidez interna, pertence ao âmbito dos típicos ideais secundários, mas se ajusta perfeitamente à imagem ideal do homem moderno. Tampouco se pode negar que o câncer obtém um êxito impressionante no plano superficial. Praticamente nenhuma outra doença pode subjugar um organismo e ajustá-lo a seus próprios desígnios tão rapidamente, nenhuma é tão tenaz e resistente às medidas defensivas e terapêuticas.

Não é de admirar que tenhamos tanto medo do câncer, já que nenhum outro sintoma está mais equipado para nos mostrar o espelho. O câncer personifica a transformação dos dignos ideais secundários no pólo oposto, o princípio do ego total. A caricatura física desse ideal costuma ser levada a mal, como toda caricatura. Mas sempre que tal ocorre como uma caricatura desse destino, isso não acontece porque ela é falda, ao contrário: ela se ajusta a ele e até mesmo o supera.
("A Doença Como Linguagem da Alma" - Dr. Rudiger Dahlke)

Nenhum comentário:

Postar um comentário